Um olhar sobre a psicoterapia

O atendimento em psicoterapia ainda é considerado um mistério, encoberto por muitas fantasias, receios e dúvidas. Vamos falar um pouco sobre isso?

30 NOV 2015 · Leitura: min.
Um olhar sobre a psicoterapia

Tenho observado que ainda hoje existe um conceito fantasioso que norteia o imaginário das pessoas em relação à ideia de psicoterapia. Muitos têm receio de dividir suas histórias com um desconhecido, um olhar misterioso de quem "analisa" interpretando cada piscar de olhos, como se fosse possível, com um simples olhar, penetrar a mente e descobrir os segredos mais escondidos e tenebrosos. Recordo-me da imagem de super-homem com o olhar biônico lendo a mente das pessoas. Não, não somos assim. Até seria interessante esta proposta, para alguma outra profissão ou para alguma situação pessoal, mas não para um terapeuta. Quem nos oferece a história é a outra pessoa sentada a nossa frente, que divide conosco suas narrativas.

Ainda sobre a ideia do estranho, compreendo a resistência quanto ao olhar do outro desconhecido, mas isso conta muito mais como um ponto a favor do que como um problema. Comumente utilizamos a premissa de que o olhar de alguém de fora de uma determinada situação contempla um horizonte maior do que o de quem está imerso a algo. Isso se aplica a uma terapia. O olhar de alguém que estudou e aprendeu técnicas que devem auxiliar na abertura do horizonte de alguém ou de algumas pessoas é bastante significativo e tem o ser valor.

Grandesso (2000, p. 243) aborda a construção da terapia como uma prática social, através de uma conversação terapêutica e "tendo como propósito a criação de um contexto facilitador para a construção de novos significados edificados em novas narrativas, ampliando o seu sentido de autoria e suas possibilidades existenciais". Para ela, a natureza dialógica e a capacidade do estabelecimento de novas relações entre os acontecimentos ao longo da vida e entre pessoas, possibilitando outros sentidos, dá à conversa a oportunidade de ela ser transformadora.

A terapia não se configura como uma fala trivial, sem finalidade ou sentido. Para ser terapêutica, novos significados devem surgir. Pessoas não vão para a terapia porque estão querendo contar para outros os seus problemas. Isso a gente faz com amigos. A busca pela terapia não parte de pessoas que estão apenas felizes ou de pessoas que querem apenas conversar. A maioria das pessoas que procuram a terapia, por iniciativa própria, tem uma narrativa estruturada em torno de histórias de sofrimento. [Não vou me adentrar aos motivos que levam uma pessoa a psicoterapia, abordarei este tema em outro momento].

Grandesso (2008, p.1) descreve que o exercício da prática da terapia é composto por um "processo reflexivo entrelaçado de teoria e prática de uma forma tal, tão intrinsecamente amalgamada, que fica difícil, senão impossível e mesmo sem muita utilidade, determinar que instância prevalece sobre a outra". A psicóloga menciona a imagem de uma dança quando pensa o que um terapeuta faz entre sua prática e o arcabouço teórico que utiliza para compreender está prática. Em outras palavras, o terapeuta nos convida para uma dança em que o ritmo é uma mistura de prática e teoria, cada cliente/paciente dançando no seu próprio estilo e compasso.

Retomando as nossas conversas com amigos, eles nos acolhem e nos escutam, uma prática também presente na terapia. Mas amigos dão o apoio emocional, envolvidos com o nosso ponto de vista, em sua maioria, agem em prol do que acreditam que é melhor para o que queremos, agem de acordo com o que esperamos. Psicólogos tem um compromisso que está acima da sua aceitação pela outra pessoa. Devem ser amáveis e acolhedores, muitas vezes dão colo e se emocionam junto com os clientes/pacientes; em outros momentos podem ser duros e secos, mas, acima de tudo, buscam uma fala no outro que possa abrir novas perspectivas ou suscitar novos questionamentos e, como objetivo principal, tornar possível um desenvolvimento pessoal a partir de uma co-construção entre terapeuta e cliente/paciente.

Foto: por Eduardo Sánchez (Flickr)

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Escrito por

Thayane Salgado

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