Vamos viajar! Chegamos!

Este artigo visa refletir sobre uma sociedade na qual as crianças não participam mais das atividades pois estão distraídas com seus aparelhos eletrônicos.

9 ABR 2018 · Leitura: min.
Vamos viajar! Chegamos!

Quando era criança, eu vivia no Paraná. E muitos dos meus familiares (em especial meus primos, com quem eu amava brincar) viviam no Rio Grande do Sul. Então, no mínimo duas vezes ao ano, encarávamos a viagem que levava umas 12h. Eu e meu irmão mais novo, que já éramos serelepes normalmente, ficávamos ainda mais pilhados pela empolgação de estar indo pra casa da vó. Vocês podem imaginar a cena: duas crianças agitadas dentro de um carro, cantando, tagarelando, brigando, querendo fazer xixi, com fome, cansadas, enjoadas do movimento do carro nas curvas ("pai, acho que vou vomit- BLÉÉÉE"). Mas hoje olho para trás e me dou conta de como essas viagens são momentos importantes na construção da história de uma família. Apesar de todas as dificuldades envolvidas em transportar crianças por longos períodos de tempo, há muito aprendizado, muita história. Aprendemos sobre as leis da estrada, o significado das placas e das faixas, o nome das cidades, o que são o tempo e a distância, quais músicas os pais gostam de ouvir. Mas a melhor parte são as anedotas , que ouvimos dos nossos pais, que eles vão relembrando pelo caminho: "eu ouvia essa música na minha adolescência / aqui uma vez eu ajudei uma pessoa / nós moramos nesta cidade antes de vocês nascerem", etc. E aí vamos perguntando, sabendo, ouvindo, aprendendo. Aprendendo sobre o mundo. E é claro, quando ficamos agitados DEMAIS, levamos um pito e assim vamos aprendendo a dar conta do nosso corpo em situações atípicas. Atualmente como viajam as crianças? Em muitos casos, em frente a uma tela. A tela do avião, do tablet, do celular, do dvd portátil. Não são as músicas da história familiar, são as músicas hiperestimulantes de um personagem cuja história é a mesma para todas as crianças e na qual ela nunca entra na narrativa. Não é a voz dos pais, que muda conforme suas emoções (e que estão intimamente implicadas com as emoções da criança), é a voz de um dublador gravada para uma imagem hipercolorida e hipnotizante. Sim, os filmes e desenhos prendem a atenção da criança e a mantém quietinha. Sim, cuidar de crianças se torna muito cansativo com muita frequência. Sim, o silêncio é muito bem vindo. Mas ao depender de barulhos eletrônicos para ter silêncio, de overdoses de cor e som, pagamos um preço alto: excluímos as crianças da participação ativa na história da viagem, ou da hora da refeição, ou da hora de brincar.Não nos queixamos de que os jovens de hoje só querem saber de resultados rápidos? Mas como poderia ser diferente, se não os levamos conosco nos caminhos? Precisamos ser capazes de reconhecer o potencial que as cenas mais banais do cotidiano tem, pois são as melhores oportunidades que temos de promover uma infância mais rica em detalhes que realmente importarão para elas no futuro.

Sobre a autora:Leonor é psicóloga e atua na cidade de Santa Maria, RS.

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Escrito por

Leonor Erberich

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