Criando filhos em tempos de isolamento social: aprendendo a escutar e fazer perguntas

Nestes tempos de isolamento social, muitos pais estão enlouquecendo com as crianças em casa o dia todo. Eles têm que assumir não apenas os trabalhos costumeiros, mas o de professor, tutor...

13 ABR 2020 · Leitura: min.
Criando filhos em tempos de isolamento social: aprendendo a escutar e fazer perguntas

Nestes tempos de isolamento social, muitos pais estão enlouquecendo com as crianças em casa o dia todo. Eles têm que assumir não apenas os trabalhos costumeiros, mas o de professor, tutor e monitor de seus filhos para suprir as demandas escolares que se acumulam online todos os dias.

O filme Click é uma comédia dramática, estrelada por Adam Sandler e Kate Beckinsale, que conta a história de Michael Newman, um arquiteto que após comprar um controle remoto universal, descobre que tem em mãos o poder de controlar sua vida e a passagem do tempo com apenas um click. Como seria bom se tivéssemos um controle assim e tudo se resolvesse em um click.

Sou psicóloga, esposa e mãe de dois filhos e seria incrível controlar as crianças por um click. Imaginei que elas iriam parar imediatamente de reclamar, aceitariam "não" como resposta, arrumariam seus quartos, fariam seus deveres, parariam de brigar entre si e seriam gratas por tudo que fazemos por elas. Seria tão bom se pudéssemos apenas levar nossos filhos a ouvir e seguir os nossos bons conselhos... Entretanto, essa não é a natureza da experiência humana, pois, não respeitaria o desenvolvimento pessoal, social, intelectual e psicológico. Deixaria de lado o livre arbítrio de nossos filhos e o pior, acabaria com a formação da autoresponsabilidade. Além do mais, o crescimento é um processo interno e não algo que pode ser imposto de fora.

Rogerk Allen, PH. D. especialista em desenvolvimento pessoal e relações familiares, propõe um método de resolver problemas que tem dado resultados incríveis para as famílias que seguiram seus conselhos. Segundo o autor, são duas as habilidades mais importantes para pais conscientes: Escuta e Avaliação. De fato, estas habilidades deveriam ser mais utilizadas para conversar e resolver problemas com crianças e principalmente com adolescentes. Mas como fazer isso? Vamos as dicas:

Dicas de como escutar e avaliar

- 1º Comece escutando para que o seu filho sinta que você é um porto seguro, de modo que ele possa se abrir e dizer as coisas que pensa sem medo de ser julgado, criticado ou ridicularizado. Vale aqui uma ênfase, jamais critique e julgue seu filho, essa é uma forma de quebrar laços de união.

Para o autor Rogerk Allen, a escuta profunda não só cria confiança como também abre o diálogo, além de manter a responsabilidade onde deve estar: em seu filho. Assim, escutando profundamente e de forma empática por meio de uma comunicação honesta e verdadeira, você como pai pode chegar à base de qualquer problema.

- 2º Capacidade de avaliar, de fazer perguntas. As perguntas devem convidar a criança a dar uma olhadinha honesta para as consequências negativas de seu comportamento.

Nesse ponto, a própria criança deve concluir que o que ela está fazendo não está correto, ou não atende a seus objetivos. É importante que a criança tenha claro que queremos o bem dela, por isso existem regras e comportamentos adequados.

Rogerk Allen afirma que a reação inicial de muitos filhos de frente ao questionamento sobre o que eles poderiam fazer para obter aquilo que desejam é culpar ou falar o que outros poderiam fazer ou deveriam ser. Sendo assim, é necessário manter o foco da atenção na pessoa sentada à nossa frente e no que ela pode fazer sobre as coisas que tem controle e que pode realizar, diante de diversas escolhas.

Um ponto interessante é questionar o que poderia acontecer caso a escolha seja colocada em ação. Isso ajuda a explorar os problemas que podem acontecer diante de determinado contexto ou situação. Para Rogerk, devemos ajudar nossos filhos a anteciparem os problemas que possam emergir e encontrar as próprias soluções, desse modo, desenvolvendo a coragem, a determinação para persistir mesmo diante de um conflito.

No exemplo a seguir você poderá ver como funciona o processo de escuta e avaliação, que não dá o peixe, mas ensina a criança a pescar.

Certo dia meu filho Ian de 12 anos veio até mim na cozinha muito nervoso, mostrando o que a irmã tinha tirado sangue de seu braço. Logo Anne chegou a cozinha para defender-se, dizendo que a culpa não era dela, pois Ian estava implicando com ela e também havia começado a briga.

- O que está acontecendo?

Eu escutei pacientemente, deixando que cada um falasse e contasse a sua versão dos fatos. Escutei sem fazer criticas ou julgamentos. Depois fiz apenas algumas perguntas para que juntos pudéssemos avaliar a situação e perguntei a meu filho:

- Ian, que comportamento seu faz Anne ficar tão brava, a ponto de te agredir fisicamente?

A primeira resposta foi uma tentativa de se justificar, dizendo que não fazia nada e que Anne agredia sem sentido, e eu deveria puni-la.

Eu respondi que entendia e que a agressão física não é um comportamento aceitável em nossa casa e que por tanto, haveria consequências. Contudo, a minha pergunta era sobre ele e sua responsabilidade no que havia ocorrido.

Depois de refletir, Ian disse que havia mudado de canal tirando o desenho que Anne assistia e então ela ficou brava e pediu que ele mudasse novamente, o que ele não fez. Ele continuou se justificando, o que é bem natural. O ponto importante nesta conversa foi levar Ian a perceber que ele tinha responsabilidade no que aconteceu com ele, pois as escolhas feitas por ele haviam levado a tal situação. Faltou perguntar se ele achava correto chegar na sala e mudar de canal.

Voltei-me para Anne.

- Anne, o que poderia ter acontecido se Ian que é bem mais forte que você, resolvesse te agredir como resposta ao seu comportamento?

Anne pensou e disse que provavelmente ele a teria machucado muito mais. Neste ponto a ajudei avaliar as piores consequências de suas escolhas. E ela pode perceber o quanto o irmão havia se contido e o risco que correu ao agir de forma impulsiva, guiada pela raiva.

- Anne o que você realmente queria?

- Eu gostaria que Ian pedisse permissão antes de mudar de canal ou pegar minhas coisas.

- Anne entendo que tenha ficado chateada, por ter sido desrespeitada, quando Ian mudou o canal da TV. E sei que é capaz de encontrar outra forma de responder ao seu irmão quanto se sentir assim novamente e o que você poderia ter feito para ter um resultado de diferente? (Aqui, ajudamos a criança a encontrar novas estratégias para lidar como situação similares no futuro)

- Eu poderia ter conversando com você ou com papai, para dizer o que tinha acontecido e contado como eu me sentia.

- E o que mais...

- Eu poderia ter conversado com ele, dizendo o quanto achava injusto o que estava fazendo.

E...

- Eu poderia ir brincar, pois, já tinha assistido vários desenhos.

Por fim, ao escutarmos as crianças, entendemos que Anne agredia fisicamente o irmão quando se sentia desrespeitada ou injustiçada e que Ian provavelmente se continha, por já ter incorporado o autocontrole, ou para evitar as consequências de tal comportamento.

Com as perguntas poderosas, ajudamos nossos filhos a compreender a responsabilidade do que lhes acontecem e também o poder das escolhas que fazem. Portanto, podem pensar em escolhas alternativas para resultados diferentes no futuro, assumindo assim o controle da própria vida.

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Escrito por

Dênia Virginia Fonseca

Consulte nossos melhores especialistas em psicologia infantil

Bibliografia

Roger K. Allen, Phd. Rasing Responsible, Emotionally Mature Children: Skills for Lds Parentes (2015)

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Comentários 2
  • Dênia Virginia Fonseca

    Izabella Ramos fico muito feliz com seu comentário, principalmente por sentir que meu trabalho contribui para sua vida.

  • Izabella Ramos

    Sempre leio ou assisto as publicações dessa psicóloga fenomenal que tanto acrescenta em nossas vidas. Gratidão pelos aconselhamento.

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