Vícios: falando de ​amor patológico

Todos queremos ser amados. Mas o que fazer quando esse sentimento é descontrolado e cai na compulsão? Sabia que, no amor patológico, a relação que se cria é similar à dependência química?

3 MAI 2017 · Leitura: min.
Vícios: falando de ​amor patológico

Amar e ser amado é desejo e emoção comum a todo ser humano. Normalmente associado com ideias de satisfação, plenitude e felicidade, muitas pessoas ainda desconhecem o fato de que o amor pode vir a se tornar um transtorno, o "amor patológico". A psicóloga Maitê Hammoud fala, agora, sobre o assunto.

O quadro de amor patológico caracteriza um transtorno de dependência emocional intensa. Assim como ocorre nos quadros de dependência de álcool e drogas, o viciado, neste caso, torna-se dependente de seu parceiro.

O termo limerência foi criado em 1979 para se referir ao estado de obsessão e dependência avassaladora por outra pessoa. Ainda com muitos estudos e pesquisas em desenvolvimento, o atual "amor patológico" está em evidência justamente por estar associado a quadros de extrema dependência emocional, que acarretam uma série de sérios prejuízos nas vidas de muitas pessoas.

Trata-se de uma dependência comportamental tão destrutiva quanto a compulsão e dependência por álcool, drogas, sexo e jogos. Como acontece em todas as compulsões e quadros de dependência, a pessoa sofre intensamente sabendo que a situação e estado em que se encontra são insustentáveis. Na maioria das vezes, guarda o segredo por vergonha ou culpa, e não consegue romper o relacionamento, se afastar, nem controlar suas emoções e comportamentos.

Diferentemente do conceito popular de que amor traz à tona o que se tem de melhor, o amor patológico pode ter resultados devastadores, tanto emocionalmente quanto socialmente. Pode colocar a pessoa em um estado extremamente vulnerável, no qual cabe, além de intenso sofrimento, agressões físicas e até crimes passionais, tamanho o seu estado de descontrole.

Como identificar se um amor se tornou patológico?

O que normalmente difere o normal do patológico são os prejuízos físicos, emocionais e sociais que costumam se manifestar na pessoa que sofre de algum transtorno. No caso do amor patológico, as principais características são:

  • abstinência (emocional) na ausência do parceiro: a pessoa pode sofrer de insônia, alterações de apetite, irritação e tensão quando o parceiro está fisicamente ou emocionalmente distante;
  • a pessoa se ocupa do parceiro mais do que gostaria: costuma negligenciar atividades diárias e o trabalho. Sofre de medo intenso e constante de ser rejeitado ou de perder o companheiro;
  • tentativa de controlar o impulso de cuidar do parceiro não funciona: mesmo que a pessoa tenha consciência de seu sofrimento intenso e tente controlar seus comportamentos, sente-se impotente em relação às suas emoções e atos. Há dedicação total ao companheiro, com a sensação de que seus cuidados e gentilezas nunca são suficientes para suprir as necessidades do outro. Também está presente o impulso irresistível de agradá-lo o tempo todo, praticamente abrindo mão de si mesmo. Insiste em manter o relacionamento, mesmo que seja insatisfatório ou abusivo, ou diante das evidências de que lhe é prejudicial;
  • a pessoa dedica muito tempo para controlar as atividades do parceiro: constantemente sofre de desconfiança e ciúmes excessivo, os quais provocam descontrole e comportamentos que dificultam a convivência, como: seguir e vigiar o parceiro (telefonemas, e-mails, redes sociais), podendo chegar à agressão física;
  • abandono de atividades antes valorizadas: assim como em outros quadros de dependência, a pessoa mantém todo o seu foco na pessoa amada, deixando de participar ou praticar atividades que antes eram prazerosas e valorizadas;
  • o quadro é mantido apesar de problemas sociais e familiares: mesmo que existam alertas e reprovação, a pessoa está com a crítica prejudicada. Tende a focar apenas em suas emoções, o que normalmente ocasiona o afastamento da família e dos amigos.

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Ciúme patológico

O quadro de amor patológico costuma estar associado ao do ciúme patológico, caracterizado pelo excesso desse sentimento, o que provoca angústia e prejuízos significativos, tanto para o ciumento, quanto para o parceiro.

Composto por uma série de pensamentos, emoções, preocupações exageradas e irracionais, o ciúme patológico possui como principais características:

  • excesso de ciúme, sem presença de delírio;
  • pensamentos irracionais e suspeitas de infidelidade do parceiro;
  • comportamentos excessivos focados na busca de informações suspeitas;
  • sentimentos intensos de tristeza, raiva, medo e culpa;
  • violência verbal e física contra o parceiro ou terceiros;
  • pensamentos e comportamentos que geram angústia e prejuízos nos relacionamentos sociais, emocionais ou sexuais;
  • manifestação de sintomas físicos quando se preocupa com o que o parceiro pode estar fazendo: taquicardia, sudorese, insônia, falta ou aumento de apetite, dificuldades de concentração em atividades intelectuais e sociais, entre outros.

Causas do amor patológico

As causas para se desenvolver um quadro de dependência emocional intenso como o amor patológico costumam ser multifatorial e envolver uma complexidade de informações e experiências daquele que sofre desse transtorno. Porém, o que percebemos como fatores comum, é que se tratam de pessoas que:

  • são vulneráveis psicologicamente, normalmente apresentando baixas autoestima e autoconfiança;
  • apresentam crises de raiva e baixa tolerância à rejeição;
  • sofrem com temores sobre solidão, merecimento e abandono;
  • vivenciaram relações conflituosas em seu núcleo familiar desde a infância. Em lares desajustados, conviveram e sofreram com situações de violência doméstica, pais distantes, dependentes químicos ou foram vítimas de abuso sexual infantil.
  • por terem pais que necessitaram de cuidados, quando criança assumiram responsabilidades temendo o abandono; quando adulta, tendem a repetir esse padrão, buscando inconscientemente parceiros instáveis e, muitas vezes, dependentes (para destinar seus cuidados).

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Além dessas características, outro fator curioso foi apresentado por um estudo realizado na década de 80 por cientistas do New York State Psychiatric Institute. Ficou constatado que o amor excessivo pode provocar, no Sistema Nervoso Central, um estado de euforia similar ao induzido por uma grande quantidade de anfetamina. Segundo os pesquisadores, o amor produziria sua própria substância intoxicante: a feniletilamina, algo que poderia explicar a dependência.

Como tratar o amor patológico?

A maioria das pessoas costuma procurar tratamento apenas quando ocorre o fim do relacionamento, sofrendo intensamente pela dificuldade de não conseguir aceitar e tolerar a intensa angústia, uma espécie de sensação de desespero ocasionada pelo rompimento.

Por falta de informação, assim como ocorre nos quadros de dependência química ou comportamental, é comum que haja dificuldade de conscientização com relação à própria patologia. A pessoa tem problemas para admitir que sofre de um transtorno e que necessita de apoio profissional.

E, mesmo quando buscam ajuda, inicialmente o foco do pensamento está voltado para: "o que eu posso fazer para ter meu companheiro novamente?", e não para "o que eu posso fazer para não ser dependente desta forma de alguém?".

A associação de psicoterapia com grupos de ajuda mútua como o Mulheres que Amam Demais Anônimas (Mada) costuma ser eficaz. O grupo propicia proteção e acolhimento, até que a adequada assistência médica e psicoterápica restabeleça a proteção interna, fazendo com que a pessoa compreenda a natureza de seus comportamentos e funcionamentos, assim como resgate e reconstrua sua autoestima.

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A avaliação psiquiátrica pode ser necessária para o estabelecimento do diagnóstico e do tratamento psicofarmacológico, se for o caso, de potenciais comorbidades psiquiátricas como depressão e ansiedade.

Embora estatisticamente o quadro esteja associado a mais mulheres do que homens, imagina-se que ocorra na mesma proporção e que os números estejam associados à dificuldade de os homens buscarem por ajuda.

Estima-se que homens que sofrem de amor e ciúmes patológico estejam mais propensos a praticar violência doméstica com suas parceiras, em atos de agressões físicas, verbais e psicológicas.

Deixamos 10 questões que vão ajudar na reflexão sobre a necessidade de buscar apoio profissional:

  1. Você costuma sentir taquicardia, angústia ou sudorese quando seu parceiro está distante ou estão brigados?
  2. Você costuma se preocupar de maneira excessiva com a vida de seu parceiro?
  3. Você não consegue diminuir os cuidados e atenção que presta ao seu parceiro?
  4. Você gasta muito tempo para controlar as atividades do seu parceiro, em atos como como ligar frequentemente para ver onde ele está?
  5. Você deixou de fazer coisas que gostava por conta de seu relacionamento amoroso?
  6. Você pensa frequentemente que seu parceiro pode ser infiel a você?
  7. Você costuma mexer nos pertences de seu parceiro em busca de informações sobre as suspeitas de infidelidade?
  8. Você já agrediu ou foi agredida fisicamente pelo seu parceiro por causa de ciúmes?
  9. Você evita eventos sociais nos quais o seu parceiro possa conhecer pessoas do sexo oposto?
  10. Você já pensou em espionar seu parceiro?

Se você respondeu sim a algumas (ou várias) dessas perguntas, não deixe que o medo lhe impeça de buscar ajuda.

Leia mais: Como começa um vício?

Leia mais: Vícios: falando de álcool e drogas

Leia mais: Vícios: falando de ludopatia, o jogo patológico

Leia mais: Vícios: falando de dependência tecnológica

Fotos: por MundoPsicologos.com

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Escrito por

Maitê Hammoud

Psicóloga clínica com curso de aperfeiçoamento em psicanálise, é especialista no atendimento de adolescentes, adultos e terceira idade. Seguindo a abordagem psicanalítica e da terapia breve, atua com foco em transtornos emocionais e comportamentais, relacionamentos interpessoais e questões familiares.

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Comentários 7
  • Milena

    Preciso de ajuda me encontro nessa situação

  • Márcia David

    Tenho 44, solteira, por minha vida já passou muito homem bom mas eu sempre destruo tudo com meu ciúmes louco... agora vejo que sempre foi uma doença ... Quero me curar ...me ajudem pelo amor de Deus...as vezes acho que vou enlouquecer

  • Vivian Louzada

    Quero ajuda de algum psicólogo por favor

  • Ana Paula Lucas

    Tem uma familiar que está com todos os sintomas, mas buscamos ajuda médica, o psiquiatra que estava a tratando não conseguiu identificar esse diagnóstico, pois ela fala com os amigos sobre o assunto e não com o médico que a trata como depressão grave e até mesmo indicou internação, mas ela não segue o tratamento corretamente... cada vez mais obsessiva e agressiva.. o que posso fazer para ajudá-la?

  • Josefa maria da silva

    Sofro com todos esses sintomas.

  • Eliandra

    Meu deus tenho tudo isso estou desesperada.tenho.tudo isso e muito mas.ja tou com vontade aprender usar drogas pra mim liberta disso tou desesperada

  • Mark

    Olá, li o artigo e pelos sintomas, estou sofrendo desse mal. Gostaria muito de uma ajuda. Estou dependende de meu amigo, o que eu faço?

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