O que a ansiedade pode nos ensinar?

A ansiedade muitas vezes surge como algo despretensioso, como uma simples pergunta, como um pensamento que vagueia e vagueia em diversas direções e não chega a lugar nenhum.

30 JAN 2024 · Leitura: min.
O que a ansiedade pode nos ensinar?

Ou muitas vezes a ansiedade chega como um mal estar no nosso corpo, como uma pontada no nosso peito, uma impossibilidade de focar no nosso trabalho, nas nossas relações.

Mas o que muitas vezes deixamos de nos perguntar, é que a ansiedade é muitas vezes uma oportunidade. Um convite que o nosso corpo ou nossa mente está fazendo para nós chegarmos a diversas perguntas. Podemos acordar no meio da noite, suados, com o coração na boca e sem ter uma mínima ideia do que está acontecendo, mas o nosso corpo está nós avisando que algo sim está errado, então vamos ao pronto socorro pensando que tivemos um ataque cardíaco e o médico diz que foi algo somente psicológico, logo para nós que sempre fomos pessoas saudáveis. O que está errado? Ou um parceiro ou parceira deixou de dar a atenção que sempre nos deu, começou a agir diferentemente conosco e do nada em alguns pequenos detalhes. Aonde que não estou dando a atenção a quem eu amo? Será que estou sendo traído(a)? Não necessariamente amo meu emprego ou amava meu emprego, mas depois de algumas mudanças da direção e/ou algumas atitudes de colegas o clima já não está mais o mesmo e agora já não me sinto tão a vontade la´. Será que quero prosseguir com esse emprego? Será que vou conseguir outro tão bom? Sempre gostei de uma vida mais dinâmica, com muitos compromissos, com muita agitação, muito "corre", mas agora já estou um pouco mais experiente e estou me vendo um pouco mais cansado, não aguento mais seguir dormindo tão pouco quanto eu dormia antes. Será que quero prosseguir com esse estilo de vida? Será que preciso realmente disso tudo que eu faço? Nunca precisei de ninguém na minha vida, nunca dependi de ninguém e sempre olhei com desdém colegas que se apaixonavam com facilidade e acabavam sofrendo nas mãos de outra pessoa, por isso sempre vivi só, mas depois de um acidente, sinto falta que alguém que cuide de mim. Será que sou realmente autossuficiente? Me sinto solitário(a) depois de muitos anos vivendo sozinho(a) ou solteiro(a). Será que vou morrer só? Estudo para um concurso e depois de muitos anos estou sempre batendo na trave e nunca alcançando a tão sonhada vaga em uma carreira final do direito, agora já não acredito tanto em mim mesmo. Porque não consigo chegar a esse resultado? Sempre pertenci a uma religião especifica e sempre tive amigos e familiares nessa religião, porém agora, depois de alguns acontecimentos, não acredito mais nessa religião, mas não consigo me separar deles, não conheço outra coisa senão todo o pessoal ligado a essa religião, e tenho medo de ser rejeitado. Esse é mesmo o caminho certo na minha vida? Será que vou ser rejeitado? Sempre gostei de um determinado sexo, mas de uns tempos para cá me vejo gostando cada vez mais de pessoas do mesmo sexo que eu, será que minha família vai me aceitar do jeito que eu sou? Será que meus amigos vão me aceitar?

Todas essas perguntas chamam a reflexão dos nossos valores, que vez por outra ficam em xeque com uma situação difícil e devemos tomar uma decisão, mas abrem uma grande oportunidade para a nossa reflexão de quem nós somos e o que podemos fazer de nós mesmos.

Diz a famosa peça de Édipo Rei, que Édipo, foi amadiçoado desde seu berço, com o destino de matar o seu pai, rei de Tebas, e deitar-se com a sua mãe. O pai dele, sabendo disso, deixou Édipo amarrado pelas pernas para morrer, mas ele foi resgatado por um servo do reino vizinho e foi dado para a rainha desse reino vizinho, que nunca pudera ter filhos. Ele cresceu sem saber quem realmente era e ao chegar a maturidade foi ele sozinho ao oráculo, quem repetiu a mesma profecia: ele mataria seu pai e se deitaria com sua mãe. Ele saiu do oráculo decidido a fugir de casa e no caminho de volta se encontrou com uma carruagem real, cujo senhor ele irritou e com quem ele acabou entrando em combate, matando todos. Este que ele matou era ninguém se não o seu pai, mas ele não sabia disso, para ele era um desconhecido. No caminho de volta para casa ele se viu numa encruzilhada: ou retornava para o reino vizinho ( que ele achava que era de fato o seu reino natal) ou iria para Tebas ( onde ele realmente tinha nascido). Ele retorna para Tebas, onde se depara com uma cidade em crise causada por um ser mítico que estava na cidade: a esfinge. A esfinge fala para Édipo a seguinte frase: decifra-me ou te devorarei. Ele decifra o enigma da esfinge e salva o reino, mas como premio deverá ser obrigado a casar-se com a recém viuva rainha ( que na verdade é sua mãe e ele não sabe ainda).

Essa tragédia grega é muito importante para rebater o ditado que muitas pessoas falam, inclusive em consultório: a ignorância é uma benção! E aqui nós vemos o que a ignorância realmente fez a Édipo: somente causou mais sofrimento, pois por não saber quem realmente era, fez o mais terrível e inimaginável que poderia fazer: matou seu pai e deitou-se com sua mãe. A esfinge na verdade não é derrotada e ela mesmo vai "devorar" a Édipo quando ele descobre que deitou com a sua mãe e então ele fura seus dois olhos, se tornando permanentemente cego. Por isso que, seja qual for o sofrimento que a ansiedade esteja causando, devemos buscar essa oportunidade para descobrir mais sobre nós ou sobre o que está realmente acontecendo conosco, o que estamos negando ou mesmo fugindo. Caso não consiga fazer por conta própria, é muito interessante que procure um psicólogo para ajudar nessa tarefa.

Referências

Salis, Viktor D. (2004) Mitologia Viva - Aprendendo com os deuses a arte de viver e de amar. São Paulo: Editora Nova Alexandria.

Perls, F. S., Hefferline, R., & Goodman, P. (1997). Gestalt Terapia. São Paulo: Summus Editorial.

Pinto, Ênio Brito. A Ansiedade e seus Transtornos na visão de um gestalt terapeuta. In: Frazão Lilian Meyer e Fulumitsu, Karina Okajima. (2017) Quadros clínicos e disfuncionais em Gestalt Terapia. São Paulo: Summus Editorial.

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Escrito por

Bruno Pontual

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