Novembro azul: um toque necessário

Por que o novembro azul deveria nos provocar ainda mais debates do que provoca?alvez porque sempre estiveram voltadas à feminilidade as inquietações de entendimento. Como se ser mulher fosse algo muito assombroso e misterioso.

19 OUT 2022 · Leitura: min.
Novembro azul: um toque necessário

Provavelmente você já ouviu falar sobre o novembro azul. Existem vários meses coloridos durante o ano. Nesse texto irei me deter nesse que chega tão tímido, assim quanto o assunto que nele é proposto para pensarmos.

O novembro azul foi uma campanha criada para conscientização dos homens para as doenças masculinas, em especial ao câncer de próstata. Todos os meses coloridos trazem iniciativas muito importantes. Mas por que esse mês azul em especial deveria nos inquietar a promovê-lo ainda mais? Diversas pesquisas apontam que os homens cuidam menos da saúde comparados às mulheres. Mas será que conseguimos pensar o porque disso acontecer? Poder esmiuçar as estatísticas para termos um entendimento do que os números estão querendo nos comunicar pode nos ajudar a pensar o porque o auto-cuidado ainda está tão distante dos homens.

Penso que grande parte do motivo por trás disso seja que nós, homens, ainda não sabemos o que de fato nos faz ser o que somos, pertencentes a um universo masculino. Pensar na nossa história pode ajudar, e eu traria em duas perspectivas: a primeira na posição masculina de vitalidade, força e proteção desde os primórdios. E dando um salto para uma realidade contemporânea: fazer um check-up anual, ir ao médico, "dar a chance" de perceber que a saúde não está muito boa me parece estremecer esse ideal masculino normativo, de modo que muitos homens possam se sentir fragilizados em sua masculinidade ao admitir essa posição vulnerável. Porém, tal vulnerabilidade é a que traz a possibilidade de se cuidar, se tratar e promover mais saúde e qualidade de vida.

A segunda perspectiva que me surgiu, que tem mais a ver com o objetivo inicial da conscientização do novembro azul, que seria um incentivo ao exame, prevenção ou tratamento precoce do câncer de próstata, foi o quanto a região de acesso para a realização do exame causa medo e vergonha em muitos homens. Medo e vergonha de uma perda do que se identifica como masculino em uma perspectiva normativa. Quem nunca ouviu piadinhas com o exame do toque. Brincadeiras que escondem também medos, inseguranças, que não são verbalizados e entendidos em sua completude. Grande parte do tabu masculino em relação ao exame do toque vem da aversão à possibilidade de um desejo associado a região anal, a qual está diretamente ligada a uma fantasia de homossexualidade. Portanto, já temos um componente aqui traçado que dá nome a esse medo. O medo de uma descoberta sexual ou de uma violação irreparável. Tais fatores só destacam uma mentalidade coletiva ainda muito cheia de preconceito e desinformação que acaba levando muitos homens a situações irreversíveis da doença por falta de auto-cuidado.

E a psicanálise?… O quanto ela pode nos ajudar, não só a entender, mas também sermos agentes de mudança desta e das gerações seguintes. Esses processos de identificação com o que é masculino, feminino, ou de qualquer outra designação de gênero se dá através do outro, da cultura. E com isso, no momento em que vamos repensando a cultura, linguagens, condutas sociais, porque não conseguiríamos repensar como nós homens lidamos com nosso corpo e nossa masculinidade? Entender o que a masculinidade normativa nos traz de prejuízos pode ser o princípio de uma trajetória menos engessada, mais libertadora e que promova mais saúde para os homens de hoje e os de amanhã.

Referências:

CONNEL, R. W. Políticas da masculinidade. Educação & Realidade, [S. l.], v. 20, n. 2, 2017. 

SILVA, S. G. Masculinidade na história: a construção cultural da diferença entre os sexos. Psicologia: Ciência e Profissão [online]. 2000, v. 20, n. 3 [Acessado 10 Outubro 2022] , pp. 8-15. Disponível em

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Escrito por

Eduardo Marchioro

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Comentários 3
  • Luiz Andrade

    Excelente texto! Temática muito importante e necessária

  • Aline e Breno

    ótimas colocações, gostamos das reflexões

  • Aline

    Achei importante ler isso de um psicologo homem. compartilhei com o meu marido pra ele ler. gostamos muito do conteudo. parabens!

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