O pais e suas expectativas sobre seus filhos: reflexões para uma formação ética

A relação entre as expectativas que depositamos em nossos filhos e o verdadeiro desenvolvimento ético que eles necessitam para crescerem em direção ao encontro de si mesmos.

13 JUL 2015 · Leitura: min.
O pais e suas expectativas sobre seus filhos: reflexões para uma formação ética

A expectativa é um sentimento comum, uma projeção para a realização de um desejo íntimo. Desejamos, esperamos e geramos a expectativa da concretização do que desejamos. Por ser justamente comum e recorrente, nem sempre prestamos atenção aos seus efeitos. A expectativa pode ser benéfica, se moderada e realista, mas também pode acarretar problemas. Nesta reflexão, focaremos na relação de expectativa dos pais com seus filhos.

Os pais geram expectativas em relação aos seus filhos fundadas em sentimentos aparentemente positivos. Isto é, pais que amam seus filhos gostariam de vê-los se desenvolver bem para que um dia sejam autônomos e felizes. Já na concepção, desejam que o filho venha ao mundo com um corpo saudável e bonito. Depois, que aprenda a andar, brincar, falar, seguindo um ritmo adequado de desenvolvimento.

É natural que os pais queiram filhos bonitos e inteligentes. Mas, na jornada da existência, o desenvolvimento de um ser humano não se manifesta como nos devaneios de nossos desejos. A complexidade do desenvolvimento se sobrepõe às fantasias de uma vida perfeita. Existem percalços, dificuldades, desarmonias, incompreensões e claro, muitas frustrações.

E essas frustrações nada mais são do que a consequência negativa das expectativas. Algo não saiu como imaginado. Então como recuperar o paraíso perdido? Chegamos ao ponto das grandes armadilhas do desejo. Pois é justamente na maneira como lidamos com essas frustrações que podemos acertar o passo… Ou perdermos o rumo e cometermos erros fundamentais.

Lidar com esse tipo de frustração não passa somente pela aceitação. É necessário que se compreenda a raiz da questão. A frustração só ocorre por conta de uma expectativa não realizada. Para se compreender a natureza da frustração, portanto, é preciso que se analise que tipo de expectativa foi gerada. Pois expectativas desmedidas só aumentam a incidência de fantasias e imposições de "deve ser" no desenvolvimento de uma criança.

Para citar exemplos genéricos: Tenho a expectativa de que meu filho seja calmo e obediente. Tenho a expectativa de que meu filho se adapte bem à escola. Tenho a expectativa de que meu filho seja sociável e amoroso com todos. Tenho a expectativa de que meu filho siga o mesmo caminho profissional que o meu. Tenho a expectativa de que meu filho goste de ler. Tenho a expectativa de que meu filho goste de esportes ou que torça para o mesmo time que o meu. Tenho a expectativa de que meu filho tenha uma linda namorada. Tenho a expectativa de que siga minha religião e se case de acordo com ela. Tenho a expectativa de que meu filho tenha outros filhos que também… E por aí seguem os devaneios.

Nos casos extremos, essas expectativas ganham ares doutrinadores. Exige-se que se cumpra o que foi profetizado. E então começam os erros. Crianças agitadas tomam remédios para se acalmar. Crianças desobedientes são excessivamente repreendidas. Crianças que não gostam de estudar são punidas até se verem obrigadas. Filhos são rejeitados quando aparecem com uma namorada que não agrada (ou com um parceiro do mesmo sexo), sofrem preconceito quando não seguem a mesma religião que a dos pais ou quando resolvem simplesmente não seguir nenhuma ou mesmo não acreditar em Deus. E etc.

A justificativa geralmente apresentada por pais que seguem esse padrão é a de que fazem assim para o bem dos filhos. O que não enxergam, porém, é que a restrição e a rejeição não acolhem o verdadeiro desenvolvimento da personalidade dos filhos. O desenvolvimento de um ser humano é único em sua essência. Cada ser manifestará luzes e sombras, aspirações, talentos, desejos, mas também erros, faltas, dificuldades. E cada um desses aspectos será uma potência a ser desvelada. O caminho da maturidade é sempre o do autoconhecimento, e isso não está relacionado a qualquer expectativa externa, mas sim na capacidade e na coragem que o ser desenvolve para olhar pra dentro de si e ter consciência de suas escolhas.

Orientar, ser a mão que acolhe e ajuda no compreender dos processos da vida é algo diferente de querer impor o que se considera ser o melhor caminho a percorrer. Quem educa é exemplo em cada ação, inclusive no modo como se educa. Impor a todo custo um modo de vida só transmite a ideia de que vale qualquer recurso para ser o que os outros esperam de si. Por lógica, esse não é um exemplo benéfico para formação de um caráter íntegro. Vale tudo para ser como meu pai? Inclusive passar por cima de outros ou mesmo de leis?

O fato é que se a criança não aprende a ser ela mesma, ela vai se tornar emocionalmente dependente e sempre precisar de aprovação externa. Vai dar mais valor ao seu desempenho acadêmico do que em sua postura ética e moral. Vai se vangloriar por status mais do que por sua felicidade. E se tornará arrogante, prepotente, rígida em seus ideais. E em casos mais graves, fanática e preconceituosa.

Tomar consciência de nossas próprias expectativas é, sobretudo, tomar consciência da realidade. É um contrassenso querer que o outro, mesmo que seja nosso filho, seja o que esperamos que ele seja. Quando passamos a ser mais realistas, ou seja, a ver o fenômeno como ele é, temos a possibilidade de solucionar os desafios que o desenvolvimento de uma criança apresenta com mais leveza e flexibilidade. Cada ser com seu tempo, com suas características, com suas capacidades, com seus sonhos.

Se nossas expectativas deixam de ser egoístas, isto é, fundadas somente em nossos desejos, e passam a ser direcionadas ao bem-estar e a felicidade do outro, então podemos começar a parar de apenas desejar o que se "deve ser" para nos ocupar com a qualidade do "ser" dessa existência que cresce e se desenvolve rumo a um amadurecimento próprio. É nesse ponto que, para dar exemplos, passamos da cobrança para a realização de perguntas: "Se meu filho não vai bem nessa escola, será que esse ambiente está adequado ao seu modo de ser? Ou será que tem faltado mais apoio nosso em suas dificuldades?", "O que será que meu filho está querendo comunicar com esse comportamento?", "Quais são seus medos, como faço para ajudá-lo a compreendê-los?", "A escola diz que meu filho não está acompanhando os estudos no tempo, mas será que ele não precisa justamente de um pouco mais de tempo para desenvolver outras habilidades antes de se dedicar melhor ao que a escola pede?", "Como faço para compreender melhor as crenças de meu filho e poder acolhê-las?"…

Com essa abertura para a consciência e para o acolher, educamos guiados pela aspiração de um desenvolvimento ético. Aceitando a diversidade e respeitando cada ser, manifestando amor e humildade para refletir e dialogar. Com esses exemplos, demonstramos que a melhor expectativa que podemos nutrir é que nossos filhos sejam plenos no viver e que encontrem seus próprios caminhos. Desta forma, semeia-se a ética do respeito a diversidade e da incessante e corajosa busca pelo que se é, pelo autoconhecimento.

Portanto, qualquer expectativa gera consequências positivas ou negativas dependendo delas mesmas, ou seja, da qualidade do que se nutre. Essencialmente, se são frutos de pensamentos egoístas, ou se são mais humanitárias, acolhedoras, receptivas a tudo o que a vida oferta. Antes de querermos educar, é importante educarmos a nós mesmos.

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Escrito por

Psicologia e Paideia - Rafael Ladenthin Menezes

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