Filhos que usam drogas e pais que se sentem culpados

Nesses anos que atuo com dependência química, vejo o quanto o sentimento de culpa acompanha praticamente todos os casos, ou por parte de quem é portador desse transtorno, ou parte de seus familiares, em especial, os pais.

A dependência química é, muitas vezes, mal entendida como desvio de caráter, sendo deixado de lado muitos fatores que a influenciam, como a genética, a influência social e o ganho emocional com o uso de drogas, o que nem sempre está sob controle dos pais ou dos cuidadores do portador dessa doença.

Acreditar ou fazer os pais acreditarem que eles são culpados, no meu ponto de vista, é algo cruel, pois a culpa é um sentimento que fere e machuca muito e não traz benefício algum. Mesmo que ações dos pais tenham trazido um impulso ao filho para usar drogas, como por exemplo, falta de atenção, cobrança excessiva ou falta de limites, não dá para responsabilizá-los única e exclusivamente pela doença desenvolvida, pois como já disse, existem outros fatores.

Quem deixa de dar atenção ao filho, cobrindo-o de bens materiais, não faz isso pensando “tomara que assim ele use drogas quando crescer!". Se houve falhas no decorrer da educação, foram por outros motivos e não esse.

A culpa pode ser considerada quando a pessoa tem plena consciência das consequências dos seus atos e mesmo assim os pratica. Então, não conseguir ou não dar limites para os filhos, por exemplo, pode ser porque o indivíduo acredita que assim essa criança ou adolescente será mais feliz ou até porque tem dificuldades de estabelecer regras.

Claro que, quando a dependência química se desenvolve em um membro da família, os pais e demais familiares também precisam de atenção, orientação e muitas vezes, tratamento. Claro que provavelmente há componentes na dinâmica familiar que precisam ser abordadas e modificadas, porque em grande parte, há comportamentos dos membros que incentivam ou facilitam o uso de drogas e eles precisam saber disso, pois normalmente adoecem junto com o portador da Dependência Química. Porém, fazê-los se conscientizar disso, não precisa ser pelo viés da culpa, que só cristalizará ainda mais o que já está disfuncional.

Entender o que é essa doença e como ela funciona, identificando quais comportamentos a alimentam na dinâmica familiar e ver que tudo o que já foi feito, não foi com a intenção de trazer o uso de drogas para dentro de casa, talvez seja um caminho mais saudável e mais leve de atuar com essa situação que já é por si só, pesada e difícil de lidar e conviver.

Foto: por garyowen (Flickr)

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