Transtorno de ansiedade, a angústia humana

Neste texto você verá a exploração de dois importantes eixos de análise para a compreensão da ansiedade, angústia humana.

6 SET 2016 · Leitura: min.
Transtorno de ansiedade, a angústia humana

A ansiedade não é em si um transtorno patológico, pelo contrário, é mecanismo biológico básico que serve como "gatilho" de alerta diante de condições ou situações reconhecidas pelo organismo como de perigo ou ameaça.

Desde que o homem é homem neste mundo, sobreviver foi também um ato de ansiedade. Ânsia por comer (o que chamamos de fome), ânsia por abrigar-se do frio, ou do calor, chuva etc. Ânsia por procriar e perpetuar a espécie... Tudo isto fez o homem progredir em muitos sentidos. A ansiedade é um poderoso motor da evolução da espécie humana.

Em vida, talvez o primeiro ato de ansiedade tenha sido o nascimento. Ansiedade tanto dos pais quanto dos nascituros. Lembremos dos inúmeros e recentes casos de Zika Vírus pelo Brasil, que deixaram tantos pais temerosos. Ansiedade também na criança, que nasce para não perecer, afinal, aos 9 meses o corpo da mãe está em seu limite no fornecimento de nutrientes e demais condições de sobrevida do feto.

A luta pela sobrevivência sempre a de gerar muita ansiedade. A esta altura poderíamos associar a palavra ansiedade a medo, temor, receio, estresse. Mas tem uma palavra, a meu ver, mais apropriada para definir a ansiedade: é a palavra angústia, que vem do latim "anguere", que significa "apertar, sufocar". Estar ansioso ou angustiado é estar sufocado, apertado.

Portanto, angustiar-se ou estar ansioso está sempre associada a algum nível de restrição respiratória, ou se preferir, para todo estado emocional de angústia ou ansiedade estará associada o seu correspondente físico, a respiração. Em síntese, não é possível vida emocional se não houver fluidez respiratória. Imaginemos algumas situações extremas, como por exemplo, a situação de sufocamento ou afogamento.

O que isso causaria? Uma crise aguda de angústia, ou seja, pânico! Outro exemplo poderia ser o de uma pessoa que, sentindo-se profundamente culpada e sob severo remorso, tem a coragem e a oportunidade de se confessar (aos prantos!) diante de sua vítima, tirando de si um peso incomensurável. Ou ainda, a experiência de um encontro amoroso pleno, entre beijos, abraços e suspiros, onde a entrega e a confiança permitem que o peito se abra e a respiração se faça profunda e serena, numa sensação de soltura e leveza.

Reparem que nestas descrições as emoções estão correlacionadas com seus respectivos ritmos e volumes respiratórios. Onde inicia-se a morte? Na parada total da respiração! Em casos de depressão crônica veremos uma correspondente contratura respiratória.

A angústia é, antes uma angústia respiratória. Reveja a foto que compõe o título deste ensaio, ela é do pintor Magritte. Note que os rostos estão cobertos por uma mortalha. É de dar arrepios a ideia de estarmos amordaçados deste jeito. Sem ar, só nos restará a angústia fúnebre! Dá para imaginar um casal a se abraçar, com este tipo de inibição respiratória?

Pois bem, neste ensaio, abordaremos dois eixos psicológicos de análise das ansiedades/ angústias.

Eixo I – O eu robô

Acontece que o ser humano é diferente dos demais animais, um ser biográfico, quer dizer, temos uma história e podemos ter consciência de que temos uma história. Registramos datas, eventos. Somos afetados emocionalmente pela nossa própria biografia, pela biografia dos outros, de maneira que nossos comportamentos viram hábitos, desenvolvemos trejeitos, maneiras etc.

Quanto mais repetimos um comportamento, mais ele vai se automatizando em nossa vida. Isto significa que, aos poucos vamos tendendo a dar certas respostas mais que outras. Recentemente fui parar num médico ortopedista, pois estava com fortes dores na altura da coluna cervical. Depois da avaliação, o veredito final foi que eu estava com problemas de postura.

Uma espécie de "lesão por esforço inadequado e repetitivo". Tipos de lesão de ordem esquelética muscular podem ocorrer em qualquer parte de nosso corpo. Podemos inadvertidamente desenvolver vícios posturais ou de esforço, seja no esporte, no trabalho, em casa, que cedo ou tarde vão gerar um torcicolo, uma tendinite e assim por diante. Mas o que aconteceria se eu tivesse uma conduta regular de conter minhas emoções? Retê-las, sufoca-las?

Ora, respiramos ao nível do tórax, as custas de musculatura intercostal e diafragmática. Isto envolve também a musculatura facial e da garganta, pois a respiração tem função importante para a fala humana. Para reter uma emoção e sufoca-la com êxito, necessariamente teremos que atuar em algum nível (e isso depende da intensidade da emoção) na musculatura orofacial, laríngea, torácica e diafragmática.

Para que eu possa conter minhas emoções de alguma forma, farei uso de minha musculatura, ou seja, tencionarei músculos que passarão da função de sustentação para a de amarração! Imagine que as emoções são como cavalos selvagens. O condicionamento e controle emocional padrão é como colocar um conjunto de embocadura no focinho do cavalo. Para parar o cavalo será preciso retesar, puxar os cordéis da embocadura.

Temos cordéis musculares por todo o corpo e farei uso deles toda vez que for controlar as emoções que não desejo que saiam e sejam vistas, sobretudo, retraindo fibras da face, garganta e tórax, por estar mais diretamente ligadas a respiração.

Se em minha biografia eu reforço enfaticamente um tipo de conduta muito restritiva, uma conduta de autorrepressão emocional e respiratória, uma hora a minha atitude será a atitude de uma pessoa ansiosa perenemente, ou seja, angustiada. Incorporarei a própria ansiedade, a angústia me tomará a garganta, o peito, o corpo. A isso o psiquiatra Wilhelm Reich deu o nome de Couraça Muscular do Caráter.

Eixo II – o medo que congela

Um outro "eixo" psicológico a ser explorado aqui é o medo de entrar em cena. O medo de atuar. Estar preparado para a ação e..., "congelar", parar, retrair. Lembro-me de uma cena de minha juventude. Tenho 49 anos hoje e tive o privilégio de participar dos famosos bailinhos de garagem quando mais jovem.

Numa dada situação, vi uma garota que me interessou. Olhares se coincidindo, encanto no ar até que tomei coragem para convidar a moça para dançar comigo. Ao decidir internamente isso, meu coração acelerou imediatamente. Suei frio. Mas fui em frente. A cada passo que dava em direção a moça, mais forte e acelerado meu coração batia. Senti a boca seca. Acho que fiquei pálido.

Pernas tremendo... Na primeira investida, desviei da garota e fui à mesa pegar um refrigerante. O coração desacelerou... Tomei mais um fôlego e me preparei para nova investida. Mas antes de revelar o desfecho, vamos analisar o que aconteceu comigo, na época com 16 anos. Meu corpo preparou-se para a ação. Claro que para um jovem da minha idade naquela época, ingênuo, uma investida galanteadora, ainda que só para uma dança, era um teste de fogo.

E se ela disser não? Parecia que todos os holofotes estavam em mim. Situação deveras ameaçadora! Era o mecanismo da ansiedade/angústia/estresse atuando em mim. Aceleração cardíaco respiratória preparando meu corpo para o "ataque", vasoconstricção periférica, todos sintomas do sistema ataque fuga. Foi o "animal em mim" me preparando para a ação. Lembremos que antes do córtex cerebral temos o cérebro reptiliano.

Na minha cabeça de adolescente, o fracasso beirava o insuportável. Seria uma vergonha. Na época isso me exigiu um esforço adaptativo descomunal. No final das contas, ponto para mim, pois realizei minha investida. Venci meu medo, entrei em cena. Gaguejei, mas falei com a moça. Coragem é agir com o coração, fazer o que é certo. Fazer o que se tem a fazer, mesmo temendo o pior.

Minha maior vitória neste dia não foi ter dançado com a garota, mas ter vencido meu temor e mostrado a mim mesmo que eu podia aprender com o meu corpo, com o meu medo, com a minha angústia. Podia lidar com minha frustração. Viver é entrar em cena. A ansiedade/angústia é amiga a medida em que ela lhe põe em alerta para o devir, mas vira sua inimiga no instante que você titubeia, vacila. Há aí uma briga de forças: fazer ou não fazer?

Vejamos outro exemplo. Estou no meu carro, trânsito amarrotado de veículos, parado e eu atrasado para chegar no trabalho. Se eu pudesse sair do carro em desabalada correria com meus próprios pés, não sentiria ansiedade nem angústia, mesmo chegando atrasado. Por quê? Porquê estaria consumindo em meu corpo aquilo que o sistema de alarme está produzindo. Dopamina, noradrenalina etc. Mas, não é isso o que acontece. Eu fico no carro, parado, querendo estar num lugar que não estou. Angústia atroz! Ansiedade.

Outra situação ainda mais terrível é a briga em família. Abrigar o mesmo teto com a esposa ou o marido que eu não suporto. Ou pelo menos, não suporto naquele momento. Mas, tenho que ficar ali. Sem poder reagir, falar, gritar... Pense você, as várias vezes em que, não encontrando uma resposta adaptativa satisfatória, viável, possível ou conciliadora, eu congelo, eu paro, eu retenho minhas emoções a partir da retenção de minhas ações.

Tenho minhas dúvidas se é possível, numa situação conflituosa desta natureza, ter algum controle emocional. Acredito que não. O que penso ser possível é o controle motor, ou seja, eu sinto a raiva, mas fecho os punhos para não bater, eu sinto o medo, mas travo as pernas para não correr, eu sinto amor, mas fecho o peito para não sentir. Ao que parece, meu controle emocional é na verdade, um controle muscular de movimentos que não realizo para não expressar o que sinto.

Obs: continua na próxima publicação.

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Escrito por

Antonio Grangeiro

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