Síndrome de burnout em estudantes concluintes do curso de Psicologia

O Burnout é um processo que se dá em resposta à cronificação do estresse ocupacional, trazendo consequências negativas em nível individual, profissional, familiar e social (Pereira 2014).

15 JUN 2021 · Leitura: min.
Síndrome de burnout em estudantes concluintes do curso de Psicologia

Burnout, no jargão popular inglês, refere-se a algo que deixou de funcionar por absoluta falta de energia. É uma metáfora para significar aquilo, ou aquele, que chegou em seu limite e, por falta de energia, não tem mais condições de desempenho físico ou mental (Pereira, 2002).

O estudo sobre a SB se iniciou na década de 1970, com o psicólogo alemão Herbert J. Freudenberguer que despertou a comunidade cientifica para pesquisas sobre o referido tema; Freudenberguer tornou-se um referencial no estudo para este fenômeno, pois em 1999 recebeu um prêmio da American psychological foundation Gold Medal Award For Life Acheivement. Desta forma, as inúmeras pesquisas publicadas e apresentadas para a comunidade acadêmica que foram surgindo, demarcaram resultados que a SB tem mais prevalência em profissionais que estão em contato direto com pessoas, com o destaque para profissionais que atuam na área de saúde, assim, a perspectiva sócio-psicológica retratada por Maslach, Schaufeli e Leiter (2011) e por Viera (2010), que é a mais aceita pela comunidade científica, constitui que SB tem três dimensões: Exaustão Emocional, Despersonalização e Baixa Realização Profissional.

A exaustão emocional pode ser descrita pelo esgotamento físico e mental; a Despersonalização, que segundo López Ibor, é um transtorno da atividade do Eu, ou seja, um estranhamento e uma infamiliaridade de si mesmo, e uma indiferença com os outros; e a Baixa Realização Profissional, que é uma percepção de inapetência laboral em relação às atividades cotidianas do trabalho.

Segundo Franco (2001), durante a formação acadêmica, o aluno de psicologia poderá viver momentos de ansiedade pela carga emocional desencadeada pelo próprio curso. Considerando que nos últimos anos da formação universitária, estudantes do curso de psicologia estão envolvidos em certas demandas que podem afetar sua carga emocional, tais como: o contato com clientes ou pacientes (de acordo com sua abordagem ou campo de atuação) no estágio ou emprego; a necessidade de assumir uma postura profissional, visto que está no último ano da formação; a preocupação em realizar uma integração da teoria conhecida até o momento com a prática na atuação; as atividades de conclusão do curso, dentre outras questões, podem desenvolver nesse público exaustão emocional, despersonalização ou um sentimento de baixa realização profissional.

Segundo Martín Monzón (2007):

o estresse acadêmico é um fenômeno complexo e que deve ser analisado por variáveis inter-relacionadas: estressores acadêmicos, experiência subjetiva do estresse, moderadores do estresse, e por último, os efeitos do estresse no contexto universitário. (Morzón, 2007 apud TARNOWSKI & CARLOTTO, 2007, p.174)

Além disso, a SB tem como protagonista agentes estressores, que são estímulos que interferem no equilíbrio homeostático do organismo e esses agentes estressores são acompanhados por disfunções físicas, cognitivas e emocionais.

Estressores físicos são resultantes de ambientes externos, demarcados por fadiga constantemente progressiva, perturbações gastrointestinais, disfunções sexuais, alterações menstruais nas mulheres, cefaleias, dores musculares, distúrbios do sono, que são marcas predominantemente corporais.

Os estressores cognitivos são caracterizados por: falta de atenção, falta de concentração, alteração da memória, lentificação do pensamento, sentimento de solidão, ausência de paciência, baixa autoestima, desconfiança, disforia, depressão, e outros que denotam sintomas semelhantes.

E estressores emocionais advêm de uma série de fatores que colaboram para os quadros multifatoriais, como exemplos: divórcio, mudança de cidade, luto, medo, raiva e derivados de componentes afetivos resultante de situações, pensamentos, emoções e comportamentos.

Com isso, as concepções teóricas relacionadas a esses agentes estressores podem apresentar de forma heterogênea as reações em distintas pessoas, pois essas diferenças relacionadas à SB se dão em função das suas vivências pregressas e de predisposições genéticas, características de personalidade, resultando assim na diferença da apresentação dos agentes estressores nos respectivos portadores da síndrome. Frente a agentes estressores ou ao estímulo temos o estresse, que tem a função de assegurar o equilíbrio do sujeito, a fim de garantir ajustes adaptativos ao problema.

Assim, diante de múltiplos fatores sobre tema, nossa pesquisa se limitará apenas a explorar se há indícios da SB em alunos do último ano do curso de psicologia.

Método

A amostra baseou-se na investigação em 18 estudantes do Curso de Psicologia de uma universidade particular da região metropolitana de Salvador, que frequentam os turnos matutino e vespertino e estão cursando o último semestre da graduação.

Do total desses investigados, sua maioria é do sexo feminino (85,7%), pertencem a classe D (42,9%), moram com filhos ou familiares (85,8%) e atuam no mercado de trabalho ou realizam estágio (85,7%). De posse dessas informações, vamos entender mais adiante a importância das mesmas nessa pesquisa.

Instrumentos

Foi utilizado o MBI-SS (Maslach Burnout Inventory – Student Survey) de Schaufeli et al. (2002), tradução e adaptação para o Brasil realizada por Carlotto e Câmara (2006), tendo por base o MBI-GS, passando a dimensão despersonalização/cinismo a ser designada por Descrença (Schaufeli, Martinez et al., 2002). O instrumento consiste de 15 questões que se subdividem em três subescalas. Exaustão emocional (5 itens); Descrença (4 itens); e, Eficácia Profissional (6 itens).

Todos os itens são avaliados pela frequência, variando de 0 (nunca) a 7 (sempre) pontos, sendo 0 (nunca), 1 (uma vez ao ano ou menos), 2, (uma vez ao mês ou menos), 3 (algumas vezes ao mês), 4 (uma vez por semana), 5 (algumas vezes por semana) e 6 (todos os dias). Médias elevadas em Exaustão emocional e Descrença e baixa em Eficácia Profissional são indicativos de Burnout.

Utilizamos um inventário sócio-demográfico para mapear as vulnerabilidades da SB nesta população para avaliar se existem vieses que influenciariam no resultado.

Ambos os instrumentos foram introduzidos na plataforma GoogleForms para enquadrar os critérios de inclusão e exclusão dessa pesquisa, bem como coletar e analisar os dados com mais agilidade e eficácia, permitindo uma melhor visualização para apuração das informações.

Procedimentos

Primeiramente foi informado o interesse da pesquisa ao professor da disciplina de interesse do estudo, para verificar com a coordenação do Curso de Psicologia se seria necessário obter autorização para aplicação dos instrumentos de pesquisa. O instrumento foi encaminhado, orientando os sujeitos participantes que respondessem uma única vez, para não anular os resultados. A aplicação ocorreu no mês de outubro de 2017, mês no qual ocorriam provas ou outros eventos acadêmicos importantes. A pesquisa foi realizada prezando por todos os procedimentos éticos conforme resolução 466 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), no que diz respeito à pesquisa com seres humanos.

As informações foram coletadas já em formato estatístico, através de gráfico demonstrativo das respostas. De posse dessas informações, verificou-se a validade das respostas e em seguida apuramos e descrevemos as informações.

Resultados

Com relação às dimensões de burnout, os resultados indicam que a dimensão de maior índice foi a de Eficácia Profissional (473 pontos), seguida pela de Exaustão Emocional (320 pontos) e, por último, a de Descrença (104 pontos). Considerando a individualidade da resposta dos participantes, e a escala de pontuação, 67% dos candidatos se encaixam na chamada Fase Inicial de Burnout, 22% estão na condição de da instalação da Síndrome de Burnout, enquanto que apenas 11% estão apresentando a possibilidade de desenvolver Burnout ou ter a Síndrome instalada.

A partir das informações sociais coletadas, podemos inferir que existem fatores que podem ter influenciado no resultado dessa pesquisa, corroborando para esses resultados de forma significativa.

Considerando que o fato da maioria dos investigados é do sexo feminino, e esse público está mais suscetível a sofrer com alterações hormonais por conta da menstruação, temos aí um agente estressor físico que interfere no equilíbrio do sujeito.

Outro dado que merece destaque é que a boa parte a amostra pertence a classe econômica D, e diante do quadro econômico que o país atravessa atualmente, dificuldades financeiras podem ser agentes disparadores de estressores emocionais, por conta de poucos recursos financeiros disponíveis para atender às necessidades deles e de seus familiares.

Além disso, o fato da maioria dos participantes da pesquisa estarem no mercado de trabalho ou atuando como estagiários e as demandas provenientes de sua atuação também podem estimular o aparecimento de desgastes emocionais, influenciando diretamente como agente estressor.

Discussão

Os resultados obtidos confirmam parcialmente a hipótese do estudo, de que estudantes no último semestre da graduação podem ser acometidos por burnout ou até desenvolver a síndrome, tendo em vista que a dimensão de Exaustão Emocional apresentou valor significativo e o percentual dos participantes em que as pontuações os classificaram na fase inicial do Burnout. Esses dados apontam para o que afirma Franco (2001), sobre as variáveis que esse público está sujeito, podendo gerar estresse acadêmico e consequentemente influenciar para um baixo rendimento nos resultados.

Os estressores presentes no final do curso podem proporcionar num desgaste maior devido ao acúmulo de tarefas: realização de estágios e relatórios, definição e elaboração de trabalho de conclusão de curso, expectativas pelas últimas avaliações e aprovações nas disciplinas, participação em reuniões e preparativos da formatura. Sem falar na possibilidade do grupo investigado conciliar estudo com trabalho e/ou estágio. Nesse período, também ocorrem ansiedades frente ao mercado de trabalho, podendo o aluno questionar-se sobre sua preparação para ingressar no mesmo. A transição do papel de aluno que recebia suporte técnico e emocional de professores, supervisores e colegas, para o jovem profissional que tem que administrar suas escolhas e atividades profissionais, pode caracterizar uma importante fonte de desgaste e exaustão emocional. O estudante de psicologia, frequentemente, em seus estágios, situados mais ao final de curso, onde trabalha diretamente com outras pessoas, pode deparar-se com situações estressoras, levando-o a um maior desgaste emocional (Nogueira-Martins, 2002). 'Nesses primeiros contatos com situações práticas pode ocorrer um "choque de realidade", ocasionando perda do significado e fascinação pelo trabalho, dando lugar a sentimentos de falta de realização profissional. (Tarnowski & Carlotto, 2009, p. 177).

A partir da pesquisa é possível inferir que existem possíveis fatores de risco para o futuro profissional de psicologia, principalmente no que diz respeito aos estressores presentes no final de curso. É possível que a SB possa começar na acadêmica e avançar para a vida profissional.

A partir do exposto na pesquisa é louvável pensar na criação de medidas preventivas para esse público acadêmico junto à instituição a partir do próprio corpo docente do curso ou na sua coordenação. Além disso, essas medidas podem ser ampliadas para outros públicos dentro da própria instituição, ou até mesmo para outras instituições de ensino.

Referências

Pereira, Ana Maria T. Benevides. Burnout: quando o trabalho ameaça o bem-estar do trabalhador. 4. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2014.

Dancey, C. P.,

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Escrito por

Jutaí Roque Nunes

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